Cepavs registram mais de 4,8 mil atendimentos até outubro deste ano
Brasília, 8 de dezembro de 2025 – “Ser mulher é viver sempre com medo”, desabafa uma das vítimas atendidas nos Centros de Especialidades para Atenção às Pessoas em Situação de Violência (Cepavs) do Distrito Federal. Entre janeiro e outubro, mais de 4,8 mil pessoas buscaram acolhimento nessas unidades, que integram a rede pública de proteção do Governo do Distrito Federal (GDF). Atualmente, o DF conta com 18 centros distribuídos pelas regiões administrativas, responsáveis por garantir atendimento biopsicossocial, encaminhamentos especializados e protocolos reforçados para atendimento às vítimas.
A procura pelos serviços, em muitos casos, é o resultado de um longo processo de reconhecimento da violência. Uma usuária atendida no Cepav de Santa Maria relata que só conseguiu pedir ajuda após meses de acompanhamento psicológico. Encaminhada pelo próprio terapeuta, ela encontrou no centro sessões individuais, grupos de apoio e uma equipe capacitada para lidar com situações sensíveis. “Falar sobre o que aconteceu não é fácil. Eu estava nervosa, sem saber o que esperar”, relembra. Morando com o agressor, ela conta que buscou apoio para compreender o que vivia e ganhar força para enfrentar a rotina de medo e insegurança.
Em outro caso, uma mulher atendida em maio deste ano relata que procurou o Cepav após indicação de uma colega. Ela buscava tratar um abuso sofrido na adolescência, mas, durante os encontros, percebeu que enfrentava novas violências dentro do próprio casamento. Ao participar das rodas de conversa e conhecer a Lei Maria da Penha, identificou sinais que antes naturalizava, como ameaças, controle financeiro e agressões psicológicas. “Aprendi a tríade: conhecer, se conscientizar e romper o ciclo. Foi aqui que entendi que amor não ameaça, não humilha e não controla”, afirma.
O atendimento nos Cepavs funciona como porta segura para vítimas que chegam por procura espontânea, encaminhamentos da rede externa ou notificações feitas dentro do hospital. O chefe do Cepav de Santa Maria, Ronaldo Lima Coutinho, explica que o serviço opera em dias úteis, das 7h às 18h, com acolhimento destinado a crianças, adolescentes, mulheres e idosos. “É um atendimento diferente de uma consulta comum. Aqui, tratamos casos de violência doméstica, sexual, intrafamiliar e também situações de negligência”, detalha.
Ele afirma que o aumento dos registros pode refletir tanto maior incidência quanto maior coragem das vítimas em denunciar. Ainda assim, a subnotificação permanece elevada. “Muitas mulheres não denunciam por medo, vergonha, dependência financeira ou por morar com o agressor. A maioria das violências acontece dentro de casa”, destaca. O Cepav, reforça, não tem caráter investigativo: sua função é oferecer suporte emocional, social e psicossocial para que cada pessoa decida os próximos passos com segurança.
O IgesDF administra o Cepav Flor do Cerrado, no Hospital Regional de Santa Maria (HRSM), que conta com equipe multidisciplinar formada por profissionais de enfermagem, psicologia, serviço social e apoio administrativo. O presidente do instituto, Cleber Monteiro, afirma que a unidade cumpre um papel essencial na proteção das vítimas. “Proteger quem sofre violência exige união entre saúde, assistência social, segurança e justiça. A integração garante respostas sólidas e efetivas”, diz.
A Rede de Flores, que reúne os 18 Cepavs, atua de forma articulada com delegacias especializadas, unidades da Assistência Social, escolas, Ministério Público, Tribunal de Justiça, Conselho Tutelar e organizações da sociedade civil. Para a assistente social Jasmin e Margarida, do Cepav Alecrim, a integração avançou graças ao trabalho dos Núcleos de Prevenção e Assistência à Situação de Violência (Nupavs), responsáveis por capacitações, vigilância das notificações e discussões de casos. “A articulação com o Conselho Tutelar é imediata quando necessária. Também participamos da Rede Brasília, reunindo serviços públicos e entidades do terceiro setor”, afirma.
Trabalhos comunitários, campanhas educativas e atendimentos complementares também contam com o apoio de iniciativas como Rede Elas, Comitê de Proteção à Mulher, Secretaria da Mulher, Protejo Cáritas, Mão Solidária e outros movimentos sociais. Segundo a psicóloga Neulabihan Mesquita, do Cepav Jasmim, a metodologia dos atendimentos prioriza grupos terapêuticos. “As famílias se reconhecem, se fortalecem. Os profissionais atuam como co-terapeutas, adaptando o processo conforme cada grupo. Não existe atendimento igual ao outro.”
Com ações integradas, equipes capacitadas e protocolos fortalecidos, os Cepavs consolidam-se como espaços fundamentais para acolhimento, orientação e reconstrução da autonomia das vítimas, oferecendo suporte essencial para romper ciclos de violência e promover proteção contínua.