Nunca é tarde para voltar a estudar. E agora, com a nova aprovação do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) da Universidade de Brasília (UnB), foi instituída por unanimidade a resolução que institui o processo seletivo para ingresso de pessoas idosas na UnB. No início de 2024 foi realizado o primeiro vestibular UnB 60mais, e agora a seleção será semestral.
O processo seletivo 60mais surgiu como uma ação da Política do Envelhecimento Saudável, Participativo e Cidadão (PESPC). Como Thaís Lamounier, diretora de Inovação e Estratégias para o Ensino de Graduação (DIEG), explica, essa é uma política é vinculada à Câmara de Direitos Humanos da Universidade. “como a gente fez esse processo seletivo aqui na UNB e fomos surpreendidos, porque a gente não esperava tantos inscritos, a gente viu a importância de acolher esse público aqui na Universidade”.
A partir de agora, a seleção acontecerá semestralmente. “Então, a cada semestre vai ser realizado o processo seletivo para a entrada desses estudantes”. Agora está sendo feita uma consulta com os cursos, para ver quantas vagas serão oferecidas no edital do segundo semestre, já que como aponta Thaís, não são vagas definitivas. A cada semestre, os cursos liberam a quantidade de vagas que serão disponibilizadas no edital. “E hoje a gente já tem 149 vagas acertadas por diversos cursos, inclusive cursos que não foram incluídos no último processo seletivo”.
O edital vai ser divulgado na segunda quinzena de abril, a data ainda não está definida mas a prova de redação será realizada em junho, para que os alunos selecionados possam ingressar no segundo semestre de 2024, em agosto.
Entretanto, Thaís destaca que essas 149 vagas já são superiores, quando comparadas com as 136 vagas disponibilizadas no primeiro processo seletivo 60mais, em janeiro deste ano. Segundo a diretora, isso se dá pelo sucesso da iniciativa. “E porque os cursos entenderam a importância desse público e o acesso a esse público”. E a PESPC vem justamente para incentivar o que Thaís chamou de intergeracionalidade. “O acesso do mais velho a educação superior e que eles interajam junto com os mais jovens, para a gente combater o estatismo”.
Thaís convida as pessoas de 60 anos ou mais, a darem uma chance para os estudos. “Agora eles vão ter essa oportunidade em cada semestre, que eles não desistam, caso não entrem no processo seletivo, que eles busquem realmente aprender como é uma prova de redação”. Muitas vezes, segundo a diretora, essas pessoas eles têm dificuldade de desenvolver o tema, desenvolver o formato da texto. Mas agora, como o processo vai ocorrer a cada seis meses, essas pessoas terão a chance de se preparar melhor para tal.
Incentivo para os próximos processos seletivos
Um exemplo de como a educação pública e as segundas chances funcionam, o funcionário público Valdir Corrêa Viana, 62 anos, foi o segundo colocado na primeira seleção do 60mais, que passou em Ciências Biológicas. Como o universitário conta, ele não tinha terminado o ensino médio. “A minha ideia era fazer terapia medicinal. Aí eu fui para o colégio, depois que minha família se formou”. Valdir foi mais por insistência da família, porque pensava que o tempo dele havia passado, e que era o momento dos filhos estudarem. “Aí fui para o Ensino de Jovens e Adultos (EJA), com excelentes professores, graças a eles estou aqui”.
Valdir vai para a UNB direto do trabalho, e enquanto estava a caminho da aula nesta segunda-feira (8), queria frisar a importância dos professores da rede pública na jornada dele até então. “Sem eles, eu não teria passado. Nessa questão, a gente tem que valorizar muito o ensino público, que é muito bom”. Para o estudante, os professores precisam ser mais valorizados.
O estudante segue contando que fez o Enem, e que tinha 520 na prova de redação. “Aí surgiu essa oportunidade que eu vi pela televisão e tal. E aí a professora Valéria me incentivou a fazer. Eu falei que eu não queria porque eu ia concorrer com gente formada”, salienta. Entretanto, a professora argumentou que ele estava na sala de aula, se preparando para fazer o Enem, e que podia fazer qualquer coisa.
Então foi assim, que depois de dois rascunhos, Valdir tirou 893 pontos na redação. “Eu não acreditava que eu passei. Tanto que eu não queria nem olhar”, acrescenta. Para a família foi só orgulho e muita festa. Valdir tem quatro filhos, todos formados, e conta que toda a família estudou no Centro 02 de Taguatinga Sul, escola em que ele fez o EJA.
Ele conta que foi bem recebido por todas as pessoas na UNB. “Os professores aqui são muito, só muito acelerados, mas era isso que eu queria”. Era isso que eu queria. Para Valdir, aprender as coisas nas aulas do curso é gratificante. “E é aquela história, tem gente que sabe mais do que eu, gente que sabe menos do que eu, e eu estou ali no meio, estou tentando fazer o meu melhor”.
São quatro anos e meio de estudos, e Valdir sabe o que quer fazer. Apaixonado pela área que estuda, o aluno quer ficar na área de pesquisa. “A minha intenção aqui é tirar tudo o que a universidade pode me oferecer. Pesquisa, laboratório, eu já fui ao laboratório duas vezes”, completa. O plano dele dentro das ciências biológicas, é focar na área de botânica, e pesquisar sobre plantas medicinais.
Para o aluno, a institucionalização do 60mais é um ganho para a sociedade. “Porque dá a oportunidade para aquelas pessoas que pensavam estarem velhos, por ser acima de sessenta anos, e que acabou a vida delas”. Valdir acredita que as pessoas tem saber que não estão velhas para estudar. “O ensino é uma evolução pessoal, um crescimento para nós como pessoas”.
Depois que Valdir passou no processo seletivo, várias pessoas da família e conhecidos dele, estão pensando em fazer também. “A minha história se tornou inspiração, porque muita gente não vê a escola pública e EJA associada com a universidade, acham que não combina”. Mas agora, com o exemplo de Valdir, as pessoas podem entender que a educação muda a vida das pessoas, a ponto de combater o estatismo e o preconceito com o EJA. O que como ele mesmo diz: o melhor local para se conviver, é na escola.
O post Processo seletivo 60+ é institucionalizado na UnB apareceu primeiro em Jornal de Brasília.