A Operação Maré completa uma semana impactando milhares de moradores do complexo de favelas na zona norte do Rio de Janeiro. As 44 escolas da região tiveram as aulas suspensas e unidades de atenção primária do Complexo da Maré precisaram fechar em determinados momentos ao longo dos últimos dias. Conforme o último balanço divulgado pelo governo do estado, as ações resultaram na prisão de suspeitos e na apreensão de armamentos, veículos, drogas e equipamentos.
Violência
Posicionamento
Organizações não governamentais (ONGs) que atuam na região informaram a ocorrência de duas mortes, mas o governo confirmou apenas uma. Segundo a polícia militar, a morte ocorreu após troca de tiros. O homem foi socorrido e levado para o Hospital Getúlio Vargas, mas não resistiu aos ferimentos. Uma arma foi apreendida, e o caso foi registrado na Delegacia de Homicídios da capital.
De acordo com o último balanço do governo do estado, até o sexto dia de operação, foram feitas 28 prisões, 103 veículos foram apreendidos, além de 14 fuzis, dez pistolas, artefatos explosivos e rádios comunicadores. Foram também apreendidos, entre outras substâncias, mais de 100 quilos de pasta base de cocaína, 300 litros de éter e duas estufas de maconha. O prejuízo das organizações criminosas é estimado em R$ 20 milhões.
As ações têm também impactado negativamente a população local. A ONG Redes da Maré, criada por moradores e ex-moradores do complexo de favelas, que monitora as ações de violência no território desde o início da Operação Maré, informa que são 120 mil moradores impactados direta ou indiretamente pelas ações policiais. A ONG registrou policiais sem identificação e sem câmeras nos uniformes, o que estaria em desacordo com as diretrizes estabelecidas na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635/2019, do Supremo Tribunal Federal (STF).
“Estamos atentos a isso e tentando incidir politicamente para que moradores se sintam seguros, se sintam informados, entendendo esse contexto de não saber como vai ser o dia seguinte, se vão conseguir levar os filhos para a escola”, disse a coordenadora do Eixo Direito à Segurança Pública e Acesso à Justiça da Redes da Maré, Tainá Alvarenga.
De acordo com o coordenador do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), Pablo Nunes, a operação tem mais impactos negativos do que positivos. Segundo Nunes, a estratégia de anunciar as operações, como tem ocorrido, faz com que as trocas de tiros e as mortes sejam reduzidas. “No entanto, a presença policial gera medo, preocupações e insegurança de que haverá conflitos, de que haverá risco à própria vida da população ao circular pelo território. Mais uma vez, uma operação é feita sem conversa, sem diálogo com a população”, afirmou.
Na opinião de Nunes, a Operação Maré não tem uma meta clara, o que também gera insegurança para a população local. “O que chama atenção e deixa também outras preocupações é que a gente não sabe até quando essa operação vai continuar, porque não há data para que termine e, principalmente, porque não há um objetivo claro que seja alcançável e que esteja publicizado para a população. A gente fica à espera de saber quando essa operação vai terminar e, até lá, a população vai seguir com essa insegurança e a rotina modificada por conta das forças policiais.”
A demanda, segundo Nunes, é por um plano qualificado, que abarque as questões de segurança pública do Rio de Janeiro de forma mais abrangente e gere resultados. Para ele, a operação em curso não responde a questões sobre o aumento da milícia, o aumento do tráfico de armamentos e munições, temas relacionados à letalidade policial. “São todas questões que têm marcado o cenário da segurança pública aqui no Rio de Janeiro, e a gente não vê o governo do estado projetando, preparando, colocando em operação ações para entender e atuar de maneira coordenada e qualificada na resolução dessas questões.”
Com as operações, a rotina das favelas é impactada. Pessoas não conseguem sair de casa para trabalhar, o comércio local é fechado, as aulas nas escolas do complexo são suspensas, assim como os serviços de saúde.
Tainá Alvarenga ressaltou que as crianças também foram impactadas. “As crianças da Maré não tiveram acesso ao Dia das Crianças, nem nas escolas, nem com as famílias. No Dia das Crianças, elas usam o espaço da rua, da sociabilidade, do lazer. São muitos os impactos. Continua havendo violência e violações e, em nenhum outro espaço da cidade, as crianças estão tendo mais de seis dias ininterruptos sem acesso ao básico, que é a escola. A gente segue nesse monitoramento, criando estratégias para que a segurança pública seja efetivada e tida como um direito para essa população.”
Fonte: Agência Brasil